quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Desmistificando a Pontuação de Vinhos

Caros Confrades:
Segue interessantíssima reportagem da revista Vinho e Gastronomia sobre os problemas e a ilusão da excessiva importância que alguns atribuem à pontuação dos vinhos.

Eles degustam com paixão e esnobismo, fazem e destroem reputações. Um ponto a mais dado por Parker faz subir 7% o preço de um vinho. Mas chegou um estudo demolidor sobre as deficiências do sistema de pontuação de vinhos.
Na mesma semana em que a Wine Spectator anuncia a sua lista dos 100 mais de 2009, o The Wall Street Journal (14-15/Nov.) divulga com chamada de capa um estudo que prova as inúmeras deficiências do sistema de pontuação de vinhos, em artigo assinado por Leonard Mlodinow, professor de randomness na prestigiosa Caltech.
Para mim, o estudo é uma boa notícia. Finalmente alguém demonstra que o rei está nu. Com oito anos de trabalho na Fundação Carlos Chagas na área de avaliação, testes e medidas, sempre suspeitei da credibilidade do sistema de pontuação de vinhos.
Faz sentido, em meio a centenas de vinhos de alto preço, buscar uma referência e medalhas e pontuações. Mas, e se for comprovado que a pontuação conferida pelo mesmo julgador em sucessivos julgamentos do mesmo vinho varia grandemente e, na verdade, não passa de uma ilusão? Ilusão poderosa, pois faz e destrói reputações, mas ilusão. Esta é a conclusão a que chegam dois papers publicados no Journal of Wine Economics, assinados por Robert Hodgson, um estatístico que também é winemaker e cientista. O mérito de seu estudo está no rigor científico, pois outros estudos já têm sido feitos, mas foram facilmente descartados por terem sido realizados em pequena escala, ambiente de laboratório etc.
Em 1996 o Journal of Experimental Psychology já demonstrava que até mesmo profissionais bem treinados não conseguem identificar com confiabilidade mais do que três ou quatro componentes numa mistura, apesar de os críticos de vinho relatarem que percebem seis ou mais. (Mais outra boa notícia para os comuns mortais que apenas identificam dois ou três aromas numa degustação.)
Em 1963 numa experiência levada a termo na celebrada Universidade da Califórnia em Davis, os pesquisadores adicionaram cor, secretamente, a um vinho seco branco para simular um sauterne, um sherry, um rosé, um bordeaux e um borgonha e submeteram essas amostras a diversos experts para estimarem a doçura dos vinhos. O julgamento desses “especialistas” refletiu o tipo de vinho que eles pensavam que estavam provando.
Também os psicólogos têm se mostrado céticos a respeito dos julgamentos de vinho, pois está comprovado que o contexto e a expectativa influenciam a percepção do gosto. Há uma década, o pesquisador francês Fréderic Brochet serviu a 57 experts em vinhos franceses dois vinhos idênticos de média qualidade: um colocado em garrafa de Grand Cru e o outro acomodado numa garrafa de vinho de mesa. Resultado: os gurus manifestaram clara preferência pelo “Grand Cru” com adjetivos de excelente, enquanto o da garrafa de vin de table recebeu os depreciativos desequilibrado e flat.
Entretanto, como já se disse, todos esses estudos eram facilmente desconsiderados por falta de rigor científico e porque nenhum deles testou os experts de vinhos que efetivamente escrevem nos jornais e revistas. Pois agora isto é passado.

Dois estudos demolidores

No primeiro estudo Robert Hodgson, o winemaker, estatístico e cientista de que falamos, pesquisou os resultados de um grupo de 70 juízes da California State Fair Wine Competition. A cada ano, durante quatro anos, foram servidos uma centena de vinhos a estes 70 juízes, em dois dias em degustação às cegas. Entretanto, Hodgson em seu estudo apresentou a cada juiz o mesmo vinho em três momentos diferentes e cada vez da mesma garrafa. Os resultados foram surpreendentes: a pontuação dos juízes variava em ± 4 pontos numa escala padrão de 80 a 100. O mesmo vinho pontuado com 91 numa degustação frequentemente recebia 87 ou 95 na degustação seguinte efetuada pelo mesmo juiz. Você pagaria R$ 200 a mais por um vinho de 87 pontos que recebeu uma nota de 95 num outro momento?
O segundo estudo traz uma descoberta ainda mais aterradora. Com os registros completos de diversas competições e a lista dos vinhos que receberam medalhas e dos que não receberam, Hodgson observou que era grande a probabilidade de um vinho -que recebeu uma medalha de ouro numa competição- vir a não receber nenhuma medalha na próxima. Notou que as medalhas se distribuíam randomicamente, i.e., aleatoriamente, com todos os vinhos tendo 9% de chance de ganhar uma medalha de ouro numa competição. Para testar a ideia, Hodgson restringiu sua atenção aos vinhos que entraram cinco vezes em competições. Montou um gráfico e observou que a probabilidade do mesmo vinho ganhar uma medalha é a mesma de você jogar uma moeda para o alto cinco vezes e dar coroa: 9%. Os resultados de Robert Hodgson foram descartados como um absurdo por um wine expert, mas junto aos winemakers não houve surpresas, pois já sabem que as pontuações são influenciadas por uma série de imponderáveis fatores como o momento do dia, o número de horas que se passou desde a última refeição do juiz além dos outros vinhos presentes na competição, etc.

Por isso, nós de Vinho & Gastronomia preferimos recomendar vinhos a recomendar notas e rótulos, mas em atenção aos nossos caros enointernautas, também divulgamos os vinhos medalhados e bem rankeados.a que alguns atribuem à pontuação dos vinhos.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Vermelho Rubi


Temo algum dia não poder mais ver o vermelho rubi
Ou não mais ouvir o verter de um vinho em uma taça
Apavoro-me diante da possibilidade iminente de não sentir mais os aromas terrosos
Nem os frutados
Quase não durmo ao imaginar a falta da acidez no paladar
Ou de não encontrar mais nessa vida a tanicidade adequada
Ainda que sabendo da única certeza dos mortais
Morro um pouco a cada garrafa acabada
Por saber que era única, perfeita e inesquecível
Apesar dos seus defeitos.